quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

a mecânica do coração



Após um quarto de hora de acertos e uma boa sopa de aletria, recupero o meu patusco estado normal.
Madeleine, essa, tem as feições tensas, como quando canta durante muito tempo para me adormecer, mas com um ar mais preocupado.
- O teu coração não passa de uma prótese, é mais frágil do que um coração normal e será sempre assim. O mecanismo de um relógio não é como os tecidos, não filtra tão bem as emoções. Tens de ser mais prudente. O que se passou na cidade, quando viste a pequena cantora, confirma o que eu temia: o amor é muito perigoso para ti.
- Adorei olhar para a boca dela.
- Não digas isso!
- Ela tem covinhas, sorri de muitas maneiras, dá-me vontade de ficar a olhar para ela.
- Tu não te apercebes, mas é como brincar com o fogo. É um jogo perigoso, sobretudo quando se tem um coração de madeira. Doem-te as engrenagens quando tosses, não doem?
- Doem.
- O mecanismo do teu coração explode. Fui eu que te enxertei esse relógio, sei perfeitamente como funciona, quais são os seus limites.

texto [excerto]: Mathias Malzieu

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